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26 nov Sobre a MPV 905, de 12 de novembro de 2019
A MPV 905/2019 faz alterações nas regras de direito do trabalho quase tão amplas quanto as que fez a Lei 13.467/2017. Muitas alterações dizem respeito a multas e à revogação de dispositivos irrelevantes, sob o ponto de vista prático, para trabalhadores e empresas. Mas há alterações substanciais em alguns aspectos.
Sendo Medida Provisória, a vigência é imediata, sujeita a apreciação futura pelo Congresso Nacional (CR, art. 62). O primeiro período de 60 dias (CR, arts. 62, §§ 3º e 4º, e 57) se encerra dia 20 de fevereiro.
I – Contrato Individual de Trabalho Verde e Amarelo (CITVA)
A se manterem os termos da MPV quando da conversão em lei, o contrato de trabalho “verde e amarelo”, ao tomar como referência a média de empregados registrados de 1º/01 a 31/10/2019 (art. 2º), se aproxima das medidas temporárias de incremento das taxas de emprego do passado (por exemplo, Programa Primeiro Emprego).
A ideia é reforçada pelos limitadores – detalhados adiante – de se tratar necessariamente (i) de novos postos, (ii) de primeiro emprego, (iii) aplicável aos trabalhadores entre 18 e 29 anos (sendo esta a faixa, atualmente, em que a taxa de desemprego é bastante superior à média) e (iv) valer apenas para contratações havidas (mas não necessariamente findas) entre 01/01/2020 e 31/12/2022.
Trata-se de contrato de trabalho especial, já que estabelece condições especiais, a partir de pressupostos específicos.
São pressupostos para sua utilização:
- tratar-se de primeiro emprego, desconsiderados aprendizagem, experiência, trabalho intermitente e avulso;
- aplicabilidade a “novos postos de trabalho”;
- limitado (como regra) a 20% dos empregados da empresa (os excedentes desse limite serão considerados contratados por tempo indeterminado, na forma do art. 16, § 2º);
- empresas com até 10 empregados podem contratar 2 empregados mediante CITVA; só a partir de 10 empregados é que se aplica a regra dos 20%;
- não ter sido empregado anteriormente na mesma empresa, no período anterior de 180 dias; esse dispositivo (art. 2º, § 4º) aparenta contradição com a ideia de primeiro emprego, trazida como fundamento no art. 1º; a solução seria considerar-se não haver restrição a que se aplique a pessoas que já tenham sido empregadas – mas isso deve gerar debate.
- aplicável para as contratações com salário-base mensal de até 1,5 salário mínimo nacional; após 12 meses, se houver aumento salarial que ultrapasse o teto, a modalidade especial fica garantida pelos 12 meses restantes, com os benefícios ainda limitados ao teto (art. 3º, § único);
- contrato a prazo determinado, no máximo de 24 meses, a partir do que se torna um contrato por tempo indeterminado “comum”;
- pode ser prorrogado mais de uma vez (inaplicável, neste contrato especial, o art. 451 da CLT);
- pode ser utilizado para atividades transitórias ou permanentes.
A lei abre uma questão: é possível a contratação, mediante CITVA, de empregado sujeito a norma coletiva que institui piso salarial superior a 1,5 salário mínimo? Prevalece a lei sobre a norma coletiva nestes casos especiais ou, na esteira da modernização da legislação trabalhista, prevalece a negociação coletiva sobre a lei (e, neste caso, o contrato em verdade terá sido do tipo “comum”)?
Os efeitos do CITVA são:
- incidência de todos os direitos previstos na CR/88, na CLT e em normas coletivas de autocomposição;
- é possível o pagamento antecipado de férias com 1/3 e 13º salários, proporcionais – aqui a lei, na contramão de jurisprudência histórica, institui um tipo de pagamento complessivo (que, vale dizer, não é vedado e tem exemplo mais famoso no DSR dos mensalistas, além do exemplo recente do contrato intermitente, cuja disposição sobre pagamentos proporcionais antecipados a MPV mimetiza);
- é possível o pagamento antecipado, diretamente ao empregado, também da indenização do FGTS (que baixa de 40% para 20%), mensalmente ou em outro período menor que 1 mês, (art. 6º, §1º); em caso de superveniente despedida por justa causa, porém, a indenização paga antecipadamente não é repetível;
- depósito do FGTS mensal será de 2%, ao invés de 8%.
As regras previstas para jornada são as mesmas do contrato de trabalho padrão. Horas extras podem ser realizadas, no máximo de duas diárias. Poderá haver ajuste de compensação e de banco de horas, por acordo individual, desde que o ajuste seja no máximo de 6 meses.
A Medida prevê capítulo de “benefícios econômicos e de capacitação”. As empresas ficam isentas:
- da contribuição de 20% ao INSS prevista no art. 22, I, da Lei 8.212/91;
- do pagamento de salário-educação (art. 3º, I, do Decreto 87.043/1982);
- das contribuições ao “Sistema S”.
Na rescisão contratual, são devidas as parcelas previstas em lei, com a possibilidade de a multa do FGTS ter sido paga antecipadamente, como dito acima.
A lei também explicita (art. 11) que não é aplicável a indenização do art. 479 da CLT (caso de rescisão antecipada do contrato a termo).
Ainda, ao trabalhador inserido nessa modalidade contratual é garantido o direito de acesso ao seguro-desemprego (art. 12).
A lei inova ao prever a possibilidade de contratação pelo empregador de seguro privado de acidentes pessoais (art. 15), sem exclusão de indenização por dano decorrente de dolo ou culpa do empregador.
O mesmo dispositivo – sugerindo fortemente (mas em redação claudicante) que se trata de uma decorrência da contratação do seguro – fixa o adicional de periculosidade no percentual especial de 5% sobre o salário-base, devido apenas quando há exposição permanente, qualificada por no mínimo 50% da jornada normal de trabalho.
A lei ainda estabelece uma restrição importante: é vedada a contratação de trabalhadores submetidos a legislação especial (art. 17). Aqui deve haver especial atenção, porque tanto na CLT quanto em legislação esparsa há regras específicas que classificam “trabalhadores submetidos à legislação especial”, tais como motoristas, vendedores viajantes, professores, profissionais de enfermagem, médicos e advogados.
Poderá haver discussão se todas essas categorias constituem o grupo dos trabalhadores sujeitos a “legislação especial”, assim como fica aberta a questão se tais trabalhadores integrarão a base de cálculo da cota de 20% referida acima como um dos pressupostos de utilização do sistema.
II – Extinção de contribuição social
A MPV, em seu art. 25, extingue a contribuição de 10% sobre o saldo do FGTS adicional à de 40% (20% para o CITVA devida em caso de despedida sem justa causa.
Essa contribuição adicional de 10% já há tempos tinha sua constitucionalidade questionada; pende no STF julgamento de recurso extraordinário sobre a matéria.
Trata-se de desoneração da folha sem retirada de direitos do trabalhador.
Esse dispositivo tem regra especial de vigência (visando a não impactar o orçamento do atual exercício): somente a partir de 01/01/2020.
III – Alterações relevantes na CLT e em outras leis esparsas
1 – CTPS
Há diversas disposições sobre a CTPS, de âmbito principalmente procedimental. Cabe destacar a competência dada ao Auditor-Fiscal do Trabalho para lançar nos registros eletrônicos do Ministério os vínculos empregatícios que constatar não anotados.
2 – Trabalho aos domingos
Os seguintes dispositivos da CLT passam a vigorar com a seguinte redação:
Art. 67. É assegurado a todo empregado um repouso semanal remunerado de vinte e quatro horas consecutivas, preferencialmente aos domingos.
Art. 68. Fica autorizado o trabalho aos domingos e aos feriados.
§ 1º O repouso semanal remunerado deverá coincidir com o domingo, no mínimo, uma vez no período máximo de quatro semanas para os setores de comércio e serviços e, no mínimo, uma vez no período máximo de sete semanas para o setor industrial.
§ 2º Para os estabelecimentos de comércio, será observada a legislação local.
Art. 70. O trabalho aos domingos e aos feriados será remunerado em dobro, exceto se o empregador determinar outro dia de folga compensatória.
Parágrafo único. A folga compensatória para o trabalho aos domingos corresponderá ao repouso semanal remunerado.
O trabalho aos domingos e feriados fica autorizado, sem ressalva de negociação coletiva. Com isso é possível realizar ajuste individualmente.
O termo “preferencialmente” aos domingos é estabelecido como um a cada 4 semanas, no comércio e serviços, e um a cada 7, na indústria.
Questão aberta: “estabelecimentos de comércio” inclui a ideia de atividade econômica do empregador? Exemplificando o potencial debate: as cooperativas possuem estabelecimentos de comércio, mas não integram a categoria econômica do “comércio”.
De certo é que a partir de agora será devida a dobra apenas se não for concedida folga compensatória.
Especificamente quanto à categoria dos professores, foi revogado expressamente o art. 319 da CLT, que dizia:
Aos professores é vedado, aos domingos, a regência de aulas e o trabalho em exames.
Aulas e exames aos domingos passam a ser lícitos.
3 – Novas regras para embargo ou interdição
Segundo o art. 161, apenas a autoridade máxima regional em matéria de inspeção do trabalho poderá determinar interdição de atividade, máquina, setor ou estabelecimento:
Art. 161. Conforme regulamento da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia, a autoridade máxima regional em matéria de inspeção do trabalho, à vista do relatório técnico de Auditor Fiscal do Trabalho que demonstre grave e iminente risco para o trabalhador, poderá interditar atividade, estabelecimento, setor de serviço, máquina ou equipamento, ou embargar obra, indicando na decisão, tomada com a brevidade que a ocorrência exigir, as providências que deverão ser adotadas para prevenção de acidentes e doenças graves do trabalho.
Fica excluída, portanto, a legitimidade do sindicato.
Além disso, a decisão deve indicar as providências que deverão ser adotadas para a prevenção de acidentes e doenças graves. Isso limita o poder do Auditor-Fiscal e torna mais objetivo o processo com vistas à liberação da atividade.
Da mesma forma, há um novo regramento da etapa recursal, prevendo prazo de 10 dias para interposição (§ 2º) e tornando obrigatória a decisão em prazo curto de 5 (cinco) dias úteis (§ 3º), com a possibilidade de concessão de efeito suspensivo.
A expedição dos certificados de aprovação dos equipamentos de proteção individual e coletiva, até então de competência do Ministério, passa ao INMETRO e laboratórios acreditados.
4 – Novas regras para bancários. Jornada de 6 horas apenas para “caixas”
Há relevante restrição da jornada especial dos bancários, conforme nova redação do art. 224 da CLT:
Art. 224. A duração normal do trabalho dos empregados em bancos, em casas bancárias e na Caixa Econômica Federal, para aqueles que operam exclusivamente no caixa, será de até seis horas diárias, perfazendo um total de trinta horas de trabalho por semana, podendo ser pactuada jornada superior, a qualquer tempo, nos termos do disposto no art. 58 desta Consolidação, mediante acordo individual escrito, convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho, hipóteses em que não se aplicará o disposto no § 2º.
…
§ 3º Para os demais empregados em bancos, em casas bancárias e na Caixa Econômica Federal, a jornada somente será considerada extraordinária após a oitava hora trabalhada.
§ 4º Na hipótese de decisão judicial que afaste o enquadramento de empregado na exceção prevista no § 2º, o valor devido relativo a horas extras e reflexos será integralmente deduzido ou compensado no valor da gratificação de função e reflexos pagos ao empregado.
Aqui as alterações são importantes. O caput passa a regrar apenas os “caixas” e prevê a possibilidade de que se possa ajustar, mesmo para eles, jornada de 8 horas por acordo individual escrito ou contratação coletiva.
O § 3º diz que os demais empregados estarão sujeitos a jornadas de oito horas diárias, o que altera a regra geral até aqui vigente.
O § 4º torna legal a hipótese de compensação da gratificação, no caso de afastamento da hipótese do cargo de confiança.
Aqui a lei tem redação confusa. Como restou mantido o § 2º, teremos um empregado com cargo de confiança sujeito a 8 horas e o empregado comum sujeito às mesmas 8 horas, por força do § 3º. Ou seja, ambos sujeitos a controle de horário. Isso acarretará, fatalmente, a redução do número de cargos de confiança contratados, pela desnecessidade de pagamento de gratificação para se obter 8 horas diárias de trabalho.
Por fim, foi expressamente revogada a Lei 4.178/62, que proibia o funcionamento de estabelecimentos de crédito aos sábados. Um problema: foi revogada também a autorização expressa para que obrigações com vencimento no sábado sejam pagáveis no primeiro dia útil seguinte.
5 – Simplificação da legislação trabalhista em setores específicos
A maioria das alterações trata de multas. Há uma alteração de potencial relevo quanto ao tempo de trabalho dos jornalistas profissionais. O art. 304, caput, da CLT, não alterado, prevê:
Art. 304 – Poderá a duração normal do trabalho ser elevada a 7 (sete) horas, mediante acordo escrito, em que se estipule aumento de ordenado, correspondente ao excesso do tempo de trabalho, em que se fixe um intervalo destinado a repouso ou a refeição.
A MP altera a redação do parágrafo único:
Parágrafo único. Para atender a motivos de força maior, poderá o empregado prestar serviços por mais tempo do que aquele permitido nesta Seção.
6 – Sistema de remuneração
O art. 457 da CLT ganha um § 5º com o seguinte conteúdo:
§ 5º O fornecimento de alimentação, seja in natura ou seja por meio de documentos de legitimação, tais como tíquetes, vales, cupons, cheques, cartões eletrônicos destinados à aquisição de refeições ou de gêneros alimentícios, não possui natureza salarial e nem é tributável para efeito da contribuição previdenciária e dos demais tributos incidentes sobre a folha de salários e tampouco integra a base de cálculo do imposto sobre a renda da pessoa física.
Atualmente a alimentação fornecida já não possui natureza salarial. A nova redação legal, então, ou (i) constitui mero recurso de ênfase, expediente não raro na legislação brasileira, ou (ii) abrange, ainda que pelo silêncio, também a alimentação fornecida fora dos parâmetros do Programa de Alimentação do Trabalhador.
Veja-se, apenas, que a redação não inclui o pagamento em dinheiro, razão pela qual as empresas devem ficar atentas a esse detalhe.
7 – Gorjetas
A Medida Provisória 905 retoma o que havia sido tentado com a Medida Provisória 808, de 2017, cuja sobrevida limitou-se a 120 dias por falta de votação no Congresso. O novo regramento se dá em moldes semelhantes, com a inclusão de dispositivo específico e parágrafos:
Art. 457-A. A gorjeta não constitui receita própria dos empregadores, mas destina-se aos trabalhadores e será distribuída segundo critérios de custeio e de rateio definidos em convenção ou acordo coletivo de trabalho.
Os parágrafos demandam leitura atenta, tal como se fez em 2017.
8 – Multa pelo atraso ou não pagamento de rescisórias
O parágrafo 8º do art. 477 da CLT tem nova redação, mas apenas para alterar a multa administrativa:
§ 8º Sem prejuízo da aplicação da multa prevista no inciso II do caput do art. 634-A, a inobservância ao disposto no § 6º sujeitará o infrator ao pagamento da multa em favor do empregado, em valor equivalente ao seu salário, exceto quando, comprovadamente, o empregado der causa à mora.
9 – RAIS
Revogado expressamente o dever legal de geração e apresentação da Relação Anual de Informações Sociais.
10 – Da fiscalização trabalhista, autuação e multas
Nesse aspecto há ampla mudança, com a alteração de diversos dispositivos, além da atualização de redação para contemplar a atual estrutura ministerial.
O art. 627 é o que alberga o maior quantitativo de alterações, para ampliar o critério de “dupla visita” nas fiscalizações:
Art. 627. A fim de promover a instrução dos responsáveis no cumprimento das leis de proteção do trabalho, a fiscalização observará o critério de dupla visita nas seguintes hipóteses:
I – quando ocorrer promulgação ou edição de novas leis, regulamentos ou instruções normativas, durante o prazo de cento e oitenta dias, contado da data de vigência das novas disposições normativas;
II – quando se tratar de primeira inspeção em estabelecimentos ou locais de trabalho recentemente inaugurados, no prazo de cento e oitenta dias, contado da data de seu efetivo funcionamento;
III – quando se tratar de microempresa, empresa de pequeno porte e estabelecimento ou local de trabalho com até vinte trabalhadores;
IV – quando se tratar de infrações a preceitos legais ou a regulamentações sobre segurança e saúde do trabalhador de gradação leve, conforme regulamento editado pela Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia; e
V – quando se tratar de visitas técnicas de instrução previamente agendadas com a Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia.
§ 1º O critério da dupla visita deverá ser aferido para cada item expressamente notificado por Auditor Fiscal do Trabalho em inspeção anterior, presencial ou remota, hipótese em que deverá haver, no mínimo, noventa dias entre as inspeções para que seja possível a emissão de auto de infração.
§ 2º O benefício da dupla visita não será aplicado para as infrações de falta de registro de empregado em Carteira de Trabalho e Previdência Social, atraso no pagamento de salário ou de FGTS, reincidência, fraude, resistência ou embaraço à fiscalização, nem nas hipóteses em que restar configurado acidente do trabalho fatal, trabalho em condições análogas às de escravo ou trabalho infantil.
§ 3º No caso de microempresa ou empresa de pequeno porte, o critério de dupla visita atenderá ao disposto no § 1º do art. 55 da Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006.
§ 4º A inobservância ao critério de dupla visita implicará nulidade do auto de infração lavrado, independentemente da natureza principal ou acessória da obrigação.
A alteração visa à racionalidade e à previsibilidade do trabalho da fiscalização, beneficiando as empresas com prazos para adequações. O § 2º enumera taxativamente os casos em que o critério da dupla visita não se aplica.
Ainda, o art. 627-A ganha nova redação no caput, mas também parágrafos que limitam os termos de ajustamento de conduta (TAC) e os termos de compromisso em matéria trabalhista.
Veja-se o que diz agora:
Art. 627-A. Poderá ser instaurado procedimento especial para a ação fiscal, com o objetivo de fornecer orientações sobre o cumprimento das leis de proteção ao trabalho e sobre a prevenção e o saneamento de infrações à legislação por meio de termo de compromisso, com eficácia de título executivo extrajudicial, na forma a ser disciplinada pelo Ministério da Economia.
§ 1º Os termos de ajustamento de conduta e os termos de compromisso em matéria trabalhista terão prazo máximo de dois anos, renovável por igual período desde que fundamentado por relatório técnico, e deverão ter suas penalidades atreladas aos valores das infrações contidas nesta Consolidação e em legislação esparsa trabalhista, hipótese em que caberá, em caso de descumprimento, a elevação das penalidades que forem infringidas três vezes.
§ 2º A empresa, em nenhuma hipótese, poderá ser obrigada a firmar dois acordos extrajudiciais, seja termo de compromisso, seja termo de ajustamento de conduta, seja outro instrumento equivalente, com base na mesma infração à legislação trabalhista.
O dispositivo vai gerar controvérsia. Isso porque, alocado em tópico que trata da fiscalização trabalhista, aparentemente regulamenta também termos de ajustamento de conduta em geral, inclusive, pois, aqueles firmados com o Ministério Público do Trabalho.
E, sendo assim, as novas regras serão:
1. prazo máximo de 2 anos, renovável por igual período;
2. multas conforme a legislação trabalhista, podendo ser elevada em caso de dupla reincidência;
3. vedação à obrigação de firmatura de dois acordos extrajudiciais que tratem do mesmo tema (por exemplo, um TAC e um termo de compromisso com a fiscalização).
Nesse ponto a lei é atécnica, porque em verdade empresa alguma é “obrigada” a firmar termo de ajustamento de conduta, que constitui um acordo. Logo, se a empresa firmar mais de um ajuste, com a mesma matéria, não se pode dizer que terá sido “obrigada”.
O prazo de defesa em autos de infração passa a ser de 30 dias, conforme nova redação do § 3º do art. 629 da CLT:
§ 3º O prazo para apresentação de defesa será de trinta dias, inclusive para a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e as suas autarquias e fundações de direito público, contado da data de recebimento do auto de infração.
O prazo recursal também será de 30 dias, conforme art. 636:
Art. 636. O prazo para interposição de recurso é de trinta dias, contado da data de recebimento da notificação, inclusive para a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e as suas autarquias e fundações de direito público.
A redução do valor da multa, em caso de renúncia a recurso, passa a ser de 30%, como regra geral, ao invés dos atuais 50%. Fica em 50% apenas para ME, EPP e/ou empresa ou estabelecimento de até 20 empregados, conforme § 5º.
11 – Atualização monetária pelo IPCA-E
A MP adota nova redação para o art. 879, § 7º, da CLT:
§ 7º A atualização dos créditos decorrentes de condenação judicial será feita pela variação do IPCA-E, ou por índice que venha substituí-lo, calculado pelo IBGE, que deverá ser aplicado de forma uniforme por todo o prazo decorrido entre a condenação e o cumprimento da sentença.
Com isso a atualização monetária dos débitos trabalhistas retorna ao IPCA-E.
Outra alteração de relevo, neste ponto, é a fixação do dies a quo da correção monetária como sendo a data da condenação.
12 – Alteração na sistemática dos juros
Se por um lado as empresas “perdem” com a atualização monetária, por outro “ganham” com a nova regra dos juros de mora. A Lei 8.177/91 passa a ter a seguinte redação no art. 39:
Art. 39. Os débitos trabalhistas de qualquer natureza, quando não satisfeitos pelo empregador ou pelo empregado, nos termos previstos em lei, convenção ou acordo coletivo, sentença normativa ou cláusula contratual, sofrerão juros de mora equivalentes ao índice aplicado à caderneta de poupança, no período compreendido entre o mês subsequente ao vencimento da obrigação e o seu efetivo pagamento.
§ 1º Aos débitos trabalhistas constantes de condenação pela Justiça do Trabalho ou decorrentes dos acordos celebrados em ação trabalhista não pagos nas condições homologadas ou constantes do termo de conciliação serão acrescidos de juros de mora equivalentes ao índice aplicado à caderneta de poupança, a partir da data do ajuizamento da reclamatória e aplicados pro rata die, ainda que não explicitados na sentença ou no termo de conciliação.
Os juros da caderneta de poupança são de 0,5% ao mês, o que representa uma queda à metade do patamar atual. Essa regra se aplica a partir da vigência. Portanto, contará 1% até a entrada em vigor da MP e 0,5% a partir dali.
13 – Participação nos lucros ou resultados
Também houve alteração na Lei 10.101/2000, que trata da PLR.
São diversos dispositivos alterados ou acrescidos, com o objetivo de dar maior segurança jurídica aos ajustes. Mais do que isso, permite que para os chamados altos empregados o ajuste seja feito diretamente, sem o estabelecimento de comissão ou intervenção do sindicato. Veja-se o § 10 do art. 2º:
§ 10. A participação nos lucros ou nos resultados de que trata esta Lei poderá ser fixada diretamente com o empregado de que trata o parágrafo único do art. 444 da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943.
A atuação da comissão paritária não mais exige presença e notificação da entidade sindical profissional.
Há inclusão de dispositivo (§ 3-A) passando a permitir a adoção de índices de produtividade ou qualidade ou programas de metas, resultados e prazos. A lei permite expressamente a ideia de meritocracia e conjuga a ideia da avaliação coletiva com a da avaliação individual. Com o empregado “hipersuficiente” ou “alto empregado” – aquele previsto no art. 444, § único, da CLT – é possível a negociação direta.
14 – Prêmios
Dentro da lei da PLR – injustificadamente não dentro da CLT – foi inserida a “regulamentação” da regra celetista sobre prêmios, definida pela Lei 13.467. Assim:
Art. 5º-A. São válidos os prêmios de que tratam os § 2º e § 4º do art. 457 da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-lei nº 5.452, de 1943, e a alínea “z” do § 9º do art. 28 desta Lei, independentemente da forma de seu de pagamento e do meio utilizado para a sua fixação, inclusive por ato unilateral do empregador, ajuste deste com o empregado ou grupo de empregados, bem como por norma coletiva, inclusive quando pagos por fundações e associações, desde que sejam observados os seguintes requisitos:
I – sejam pagos, exclusivamente, a empregados, de forma individual ou coletiva;
II – decorram de desempenho superior ao ordinariamente esperado, avaliado discricionariamente pelo empregador, desde que o desempenho ordinário tenha sido previamente definido;
III – o pagamento de qualquer antecipação ou distribuição de valores seja limitado a quatro vezes no mesmo ano civil e, no máximo, de um no mesmo trimestre civil;
IV – as regras para a percepção do prêmio devem ser estabelecidas previamente ao pagamento; e
V – as regras que disciplinam o pagamento do prêmio devem permanecer arquivadas por qualquer meio, pelo prazo de seis anos, contado da data de pagamento.
A MP torna mais seguro o pagamento do prêmio não salarial. A tentativa de regulamentação havia ocorrido com a já citada MP 808, não transformada em lei no começo de 2018.
O prêmio, diz a MPV, é aquele que decorre de “desempenho superior ao ordinariamente esperado”, mas nesse caso o desempenho ordinário deve ter sido definido previamente, em avaliação discricionária do empregador.
O pagamento da premiação é limitado a quatro oportunidades por ano e a uma oportunidade por trimestre. As regras de pagamento devem também ser estabelecidas previamente.
15 – Aplicação das alterações aos contratos de trabalho vigentes
Em dispositivo de duvidosa constitucionalidade – potencial afronta ao direito adquirido –, a MP diz que as regras se aplicam aos contratos de trabalho vigentes:
Art. 52. Ressalvado o disposto no Capítulo I, as disposições desta Medida Provisória aplicam-se, integralmente, aos contratos de trabalho vigentes.
IV – Disposições finais. Dispositivos de lei revogados
A MP, por fim, revoga diversos dispositivos legais, a grande maioria por evidente obsolescência. Merecem destaque:
a revogação de normas relativas ao registro de diversas profissões – desde profissões que não devem gerar clamor social, como a de lavador e guardador de veículos, até outras que devem gerá-lo, como a de jornalista –, o que demandará análise caso a caso;
a revogação do dispositivo da Lei 8.213/91 que classificava o acidente de trajeto como acidente de trabalho. Nestes casos a empresa não mais estará obrigada a emitir CAT.